





A TRADIÇÃO ESTÁ VIVA – MESTRE ZÉ NEGUINHO E O COCO DE RODA NA TRADIÇÃO DOS VELHOS CANTADORES.
Por Cabôco Guajajara e Una Quilombola
O Quilombo Casa vem mediando essa chegada que é mais um retorno que uma novidade. É um futuro ancestral é um passado que já era contemporaneo desde seu nascimento e origem é materialização da própria matéria prima do tempo. A linguagem da memória eternizada em ritmo, letra e canção. Seja bem vindo de volta Mestre Zé Neguinho, nós daqui de Olinda, daqui do Quilombo urbano do Amaro Branco, tal qual seu Morro da Conceição, tal e qual sua Casa Amarela, terra do coco de roda, o saudamos!!
Tradicional manifestação artística e cultural nordestina, o Coco de Roda tem múltiplos e diversos significados para além da música, da dança e da poesia. Arte presente em contextos como festas juninas e ritos religiosos afro-indígenas há gerações e gerações, tem origem histórica e territorial que remonta ao Quilombo de Palmares e se perpetua e distribui por toda a região nordeste entre quilombos, aldeias indígenas e camadas médias urbanas com o advento dos anos 1900.
É claro que outras interpretações e perspectivas de surgimento podem ser defendidas dada a sua tamanha complexidade e diversidade que nos maravilha e encanta em seus dinamismos e transformações. Sem nos apegarmos a tentativa de definição ou do estabelecimento de uma crítica genética do ritmo e estilo musical tão característico, gostaria de me deter em uma notícia que promete abalar o cenário contemporâneo do Coco de Roda pernambucano, em especial, do Coco que tem origem e que é feito na Zona Norte do Recife.
A chegada ao grande público da obra “Pandeiro na Mão” do Mestre Zé Neguinho do Coco é o fim de uma espera de quase duas décadas. A comunidade coquista mais atenta sabia da existência desse trabalho realizado por volta de 2009 e 2010. Só que mais de 15 anos depois, a famosa e quase perdida gravação ganha tônus e corpo para se manifestar dessa vez em sua inteireza e completude.
O trabalho de gravação, mixagem e masterização do produtor musical Flávio Mamoha vai enfim ganhando contornos de obra acabada e se prepara para vir à luz com a forma devida e o cuidado necessário para ressaltar ainda mais o talento e brilho da voz única e do estilo elaborado e arrojado do coco de roda do Mestre Zé Neguinho. Desde suas composições mais conhecidas como Pau de Quiri, já célebres nas vozes de Silvério Pessoa e da Banda Cascabulho, o registro fonográfico do Mestre realizado no Estúdio Carranca foi então recuperado pelo músico e produtor musical resonsavel pela gravação do disco, Flávio Mamorra, radicado nos Estados Unidos há mais de 10 anos
Figura 1 - O Produtor Flãvio Mamoha, em sua casa/estúdio, no Texas,EUA.
O disco que tem origem num projeto apresentado a Lei de Incentivo Municipal de 2009, teve seu áudio captado no Estúdio Carranca – sob a coordenação de Carlinhos Borges – e o grupo que acompanhou o
Mestre Zé Neguinho contou com nomes como Bruno Vinesof, Guga Santos e Guga Amorim nas percussões e Silvana Café, Joana Veloso e Aninha Araújo nas respostas. A mítica gravação também contou com a participação mais que especial de Nilton Jr. (Coco de Toré Pandeiro do Mestre).
Com algumas letras improvisadas no momento da gravação, num coco melódico ilustrado por sua voz aveludada e marcante, o repertório conta com cantorias como “Chegô, chegô”, “Pandeiro na Mão”, “Meu Louro”, “Quincé”, “Pau de Quiri” e “Nunca mais choveu”, que serão disponibilizado em três momentos e a primeira leva chega a agora nas plataformas digitais no dia 25 de abril de 2025.
O coco de roda é um mistério e como tal tem seus segredos e preceitos, uma arte, um saber, uma ciência e uma medicina. Na seara na qual transita e exercita o Mestre Zé Neguinho, o Coco de Roda na Tradição do Coco de Sala, nessa ordem dos Velhos Cantadores, a base é essa ciência da memória e da criatividade que se caracteriza pelo improviso e pela levada cadenciada do pandeiro e sua matinada. Fosse no São João ou Carnaval, em batizado ou casamento o Coco tem sua vez. O coco de roda é uma forma de transmissão de conhecimento entre gerações e assim uma forma específica assumida pela memória social, em Pernambuco, o caso não é diferente, em especial, em Recife e sua região metropolitana. Contemplemos e desfrutemos dessa notícia que incendeia e vira o cenário do coco de roda pernambucano dos pés à cabeça.


